Cruzeiro do Sul trava batalha de consciência contra a violência sexual

Uma sociedade que não tem consciência dos seus direitos e deveres jamais poderá ser protegida conforme a lei determina. A afirmação é da delegada de Polícia Civil, Carla Ívane de Brito, titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), em Cruzeiro do Sul (640 quilômetros de Rio Branco), que lançou, em novembro, uma campanha contra os crimes de cunho sexual.
Nos últimos três anos, 60 crianças foram violentadas sexualmente no município. No mesmo período foram registrados 752 casos de violência doméstica na Deam. “A polícia tem atuado firmemente e prendeu centenas de agressores”, diz Carla Ívane.

A delegada Carla de Brito (D) ao lado da ativista Maria da Penha, que emprestou seu nome à lei em proteção das mulheres (Foto: arquivo pessoal)
A delegada Carla de Brito (D) ao lado da ativista Maria da Penha, que emprestou seu nome à lei em proteção das mulheres (Foto: arquivo pessoal)

A delegada combate, na região de Cruzeiro, a prática de pedofilia, entre outros crimes contra a dignidade sexual. Ela narra vários casos, como aquele em que o agressor, em uma relação incestuosa, praticou cárcere privado, estupro, e privou os filhos de qualquer acesso à saúde, educação e lazer.
Conscientização
Desde o final do ano passado, a delegada lançou uma campanha de conscientização social, proferindo palestras nas escolas de ensino fundamental e médio. Mensalmente, Carla Ívane realiza, também, palestras na sede do município e na zona rural. O objetivo é esclarecer os direitos individuais das mulheres, apresentando os preceitos da Lei Maria da Penha e promovendo uma reflexão acerca da violência de gênero, o que incentiva as denúncias e evita a impunidade.
Esse movimento teve início com uma caminhada, em que os participantes se reuniram no centro de Cruzeiro. Participaram do evento representantes da Rede Reviver (Rede de Proteção aos Grupos de Vulneráveis), que é formada pela Deam, pelos centros de referência social (Cras e Creas) e Conselho Tutelar, além da Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres (SEPMulheres).
Denúncias
“O estímulo às denúncias, realizado nas palestras, aumentou o número de procedimentos realizados na Deam. Isso quer dizer que a população está compreendendo que comportamentos criminosos têm que ser punidos”, afirma a delegada.
“Em 2012, no município de Cruzeiro do Sul, houve um aumento em mais de 100% de procedimentos policiais em relação ao ano de 2011. Em aproximadamente 80% dos casos existem relatos de violência recorrente no âmbito doméstico, sendo que após um longo período vivendo sob abuso é que a vítima tem a coragem de procurar a polícia”, continua Carla.
Quanto aos crimes cometidos contra menores, especificamente os de cunho sexual, observou-se o mesmo comportamento. “Houve um aumento de registros em 2012. São muitos os casos confirmados e a Polícia Civil tem sido ativa”, enfatiza, ressaltando que no ano passado 14 representações de prisão por estupro foram concretizadas na Deam, ocasionando a prisão de 12 estupradores.
Carla ressalta, também, a importância do empenho de todos os profissionais de sua equipe, como agentes, escrivães, auxiliares administrativos e estagiários. “Devo muito a todos. Sem eles, não seria possível executar o trabalho e obter resultados satisfatórios”, diz.
Casos impactantes
Ao investigar um estupro, a delegada Carla de Brito ouviu vários relatos que considerou impactantes, entre os quais o de uma mãe que descobriu que o vizinho da frente estava aliciando sua filha. Após investigações, foi constatado que o acusado se dirigia à escola da menor e oferecia-lhe presentes. Assim, ganhou a confiança da menor e conseguiu o seu escopo, mantendo com ela relacionamento sexual. Foi indiciado e preso. Julgado, foi condenado a 12 anos de prisão.
Outro caso que deixou a equipe da delegada chocada foi o de um casal de irmãos, a menina de 8 anos e o menino de 7 anos, que eram abusados sexualmente pelo pai e pelo irmão mais velho. A menina, além de ser submetida aos abusos sexuais, era obrigada a realizar todas as atividades domésticas. A mãe das crianças também era vítima de violência doméstica e nunca teve coragem de denunciar o agressor, que já havia cumprido uma condenação por homicídio.
Barreiras
“Algumas das barreiras que buscamos superar são o machismo, a cultura patriarcal e ausência do acesso à informação nas localidades mais distantes. A conscientização da população em geral é bastante necessária. A participação de todos, poder público e sociedade civil, é fundamental”, disse a delegada.

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