1ª cega de nascença a se formar em química defende monografia no AC

 Lidiane ao lado da orientadora Anaelise (Foto: Veriana Ribeiro/G1)

A estudante de Química Lidiane dos Santos Marino apresentou na noite de quarta-feira (13) seu trabalho de conclusão de curso na Universidade Federal do Acre (Ufac). Este poderia ser um caso cotidiano, não fosse um detalhe: ela é a primeira estudante cega de nascença a se formar neste curso em todo o Brasil.
“Até onde temos conhecimento, ela é a primeira cega de nascença a se formar em Química. Existem exemplos de cegos formados em química no Brasil, mas eles enxergavam e foram perdendo a visão gradativamente”, explicou a orientadora de Lidiane, professora Anaelise Maria Regiani. 
Natural de Rio Branco (AC), Lidiane tem 32 anos e terminou agora sua primeira graduação. Na faculdade, já começou quebrando preconceitos. Ela foi a primeira colocada de sua turma em uma época em que a universidade não oferecia vagas exclusivas para pessoas com deficiência. Lidiane lembra que foram muitas as dificuldades enfrentadas para chegar neste momento. Foi pensando em sua trajetória que ela optou fazer seu estudo sobre a inclusão para deficientes visuais. A monografia é intitulada ‘Reflexões sobre a prática pedagógica do docente cego no ensino de Química para aluno cego’.
“Eu resolvi fazer essa monografia já pensando na minha dificuldade, como ajudar outro aluno com deficiência visual”, comentou Lidiane.
Para isso, fez uma pesquisa na escola Armando Nogueira, onde na época estudava um deficiente visual. Foram realizadas entrevistas e após cada aula ministrada, Lidiane escrevia um diário sobre suas reflexões como docente. Ela lembra que muitas vezes foi difícil analisar o tema com a objetividade de um pesquisador.  “Justamente escolhi esse tema por conta das necessidades que eram as mesmas que eu tinha, até na hora de analisar o que os alunos falavam, o que os entrevistados falavam. Demorei para fazer essa pesquisa porque em tudo eu lembrava a minha trajetória”, comentou a concludente.
A orientadora de Lidiane lembra que era coordenadora do curso na época em que a estudante ingressou na universidade, e inicialmente ficou preocupada. “Nossa primeira sensação é o impacto, porque a gente não imagina porque um cego quer fazer química. Quem já é químico pensa logo, como ela vai fazer uma titulação, que é um procedimento todo visual?”, comentou a professora.
Mas suas preocupações terminaram logo após a primeira conversa com a estudante. “O primeiro passo foi conversar com a Lidiane, tentar entender qual era expectativa dela, que era cursar licenciatura. Dentro dessa expectativa de ser professor é totalmente possível ela ser professora de química sendo cega. O que a gente quis trabalhar foi como ela poderia melhor compreender os modelos, as teorias e a experimentação em química”, afirmou Anaelise.
Vivendo a experiência de universidade com Lidiane, a professora modificou sua visão em relação ao profissional de química. “Toda profissão tem possibilidades inclusivas”, comenta a professora.
Para Anaelise, o processo foi uma adaptação, tanto para Lidiane, como para a universidade e a própria professora. “Eu tive que conhecer as ferramentas adaptadas para deficientes visuais, fui conhecer o braile, saber que existe uma linguagem química em braile, uma codificação própria. Tentar compreender como eu poderia fazer essas adaptações”, lembrou.
Em parceria com a universidade, que tem um centro de apoio à inclusão de pessoas com deficiência, e outras faculdades de químicas que tem trabalhos de adaptação para deficientes visuais na profissão, as adaptações foram feitas.
Nesse processo nasceu no ano passado o “Curso de Adequação de Materiais para o Ensino de Química aos alunos com Deficiência Visual” que chega este ano a sua segunda edição. O evento acontece no período de 13 a 15 de março no campus de Rio Branco, na Ufac, realizado pela universidade em parceria com o Grupo de Estudos e Pesquisas em Ensino de Ciências no Acre e a Secretaria de Estado de Educação e Esporte (SEE).   
fonte  /g1.globo.com

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