Homem cura por meio de reza e plantas medicinais em reserva no AC


Curandeiro Acre (Foto: Rayssa Natani/ G1)
Para a comunidade residente da Reserva Extrativista do Cazumbá-Iracema, no município de Sena Madureira (AC), distante 136 km de Rio Branco, o idoso Leonardo Vieira, de 70 anos, é como um médico, e a floresta uma farmácia natural. ‘Curandeiro’ ou ‘rezador’, como é chamado, seu Léo diz ser capaz de curar de dores físicas a ‘doenças da alma’ com o auxílio de reza e plantas medicinais
No quintal de casa, ele faz suas consultas e cultiva algumas das plantas utilizadas como remédio. Folha de pinhão roxo nas mãos, pés sempre descalços e a oração na ponta da língua, ele inicia um ritual de cura. Depois de uma conversa prévia com o enfermo, ele se prepara para atuar. Tira o boné, utilizado com frequência pelo homem, as sandálias e arranca do pé uma folha de pinhão.
Apesar de demonstrar certa resistência para revelar os segredos de seu ofício, ele diz que cada coisa possui um significado especial. “O pinhão-roxo, com três pontas, que eu uso para fazer a reza em quem precisa, representa a santíssima trindade. Os pés devem estar em contato direto com a terra, de onde recebo força. Minha cabeça também deve estar livre”, diz.
O mistério em torno do processo faz parte da tradição. Vieira explica que de acordo com sua crença, a ‘força da cura’ é muito poderosa e deve ser resguardada. “Se eu for ensinar para alguém, eu perco a minha força. A força da cura só pode ser transmitida de rezador para rezador. E aquele que transmite seus ensinamentos para outro, automaticamente perde seu poder”, diz.
Foi assim há 40 anos, quando o idoso recebeu os conhecimentos de uma mulher, também moradora do lugar. “A força só pode ser passada de uma mulher para um homem, ou de um homem para uma mulher”, revela mais um segredo. “Durante um ano, ela me repassou os conhecimentos sobre as plantas, e rezas que eu tinha que fazer todos os dias, sem perder uma noite, até me tornar um rezador”, relembra.
Curandeiro Acre (Foto: Rayssa Natani/ G1)
Para Vieira, ser curandeiro não foi uma escolha,  mas um dom entregue por Deus. "Eu sempre gostei de ajudar o próximo. Desde o pequeno, ao grande. Isso contribui para o meu oficio. Mas acredito que recebi um dom e apenas o venho desenvolvendo ao longo da vida. Fico feliz em ser útil para as pessoas que precisam", diz.
E o dom de seu Léo favorece a todos na comunidade, que é isolada. O único posto de saúde existente no Núcleo do Cazumbá, onde moram 40 famílias, entre elas a do idoso, não funciona. Para chegar até a área urbana de Sena Madureira em busca de atendimento médico, é preciso enfrentar duas horas de viagem de voadeira [barco a motor muito veloz] pelo rio Caeté.
Elisângela Silva é uma das moradoras do núcleo. Vizinha e nora do rezador, ela diz ter um enorme sentimento de gratidão pelo homem que já curou seus dois filhos pequenos. "Os meninos estavam cheios de caroços pelo corpo e todos pensavam ser catapora. Levei no seu Léo, ele disse que era um chamado 'mal de reza'. Ele os curou, e graças a Deus não foi preciso ir até a cidade", conta.
"Para cada dor, há um remédio", diz Leonardo. Na mata, o óleo da Copaíba é o mais utilizado e receitado pelo curandeiro. Os próprios moradores da reserva, em sua maioria extrativistas, furam o caule da árvore até o centro e coletam o líquido produzido como mecanismo de defesa do vegetal, contra pragas naturais, como cupim. Um cano de PVC é implantado para que na próxima coleta não seja necessário um novo furo.
Léo explica que o óleo tem ação antiinflamatória e é utilizado externamente e também internamente, porém em quantidade pequena. "O óleo da copaíba serve para quase tudo. Para infecções, dores e inflamações. Mas ele é muito forte e deve ser utilizado com cuidado", alerta.
Para as 'doenças do espírito', a principal receita é defumação com folhas brancas. "A fumaça leva a doença para longe", explica o homem. Ele destaca que tudo quanto há na natureza, pode ter uma utilidade, mas para quem deseja a saúde, só há um remédio mais eficaz. "Das plantas que nós temos por aqui, as que não servem para uma coisa, servem para outra. Mas a fé é o mais importante de tudo isso. Se não tiver fé, nada funciona", conclui. 
fonte g1