As entrevistas com 79 pessoas — entre ex-presidentes da República, congressistas, diplomatas, procuradores, juízes, policiais, advogados, representantes da ONU, pesquisadores e traficantes — e a análise de 4.300 páginas de informações públicas e sigilosas dos quatro países e dos Estados Unidos permitiram montar os perfis dos embaixadores do Narcosul nesta série de reportagens, cofinanciada pelo Instituto Prensa y Sociedad (Ipys). São traficantes que mais se assemelham a executivos do que a criminosos em favelas. Conduzem suas operações de qualquer lugar, armados de laptops e conectados a redes sociais.
Numa viagem de 15.654 quilômetros por 16 cidades em quatro países, vieram à tona as estruturas — ou a falta delas — que fazem o Narcosul prosperar para atingir os 14 milhões de usuários de cocaína e maconha no continente. Seja em Epitaciolândia, Pedro Juan Caballero, La Paz, Lima ou Iñapari, fica clara a maneira como esses traficantes operam. Dividindo territórios, estabelecendo tratados entre si e corrompendo autoridades para aumentar lucros e reduzir riscos, os embaixadores superaram em eficiência a integração oficial de seus países. Para eles, as fronteiras viraram pó.
O poder também foi pulverizado. Existem execuções e acertos de contas, mas não há chacinas à moda mexicana. As guerras internas cessaram. Os cartéis, barões oupatrones dos anos 1980 ficaram para trás. Esqueça Pablo Escobar.
O Narcosul se vale das características dos países onde atua. Peru e Bolívia são os dois maiores produtores mundiais de cocaína, pasta base e outros derivados da folha de coca. O Paraguai encabeça o cultivo de maconha na região. E o Brasil tem duplo papel: é o segundo no ranking mundial de consumo de cocaína e derivados e principal entreposto para a Europa e a África.
No último 31 de março, não era Cabeça Branca ou Javier que chamava a atenção dos policiais no posto de fronteira em Cobija, cidade boliviana separada da brasileira Epitaciolândia (AC) por uma pequena ponte esburacada — as obras pararam há dois anos depois de a Bolívia interromper o pagamento à empreiteira. Animados, indagavam-se qual seria a espécie do macaco de quase meio metro de altura que há anos vive no posto. Talvez estivesse ali um símbolo simples do que é o Narcosul.
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