No Acre, mãe e filha voltam a ouvir após implante

"Me emociono vendo ela tentar falar algumas palavras, antes ela não falava nada', declara Erlene Paiva, de 25 anos, ao se referir à filha de cinco anos, Ana Cristina Oliveira. Há um mês, ela e a filha foram submetidas a uma cirurgia para um implante coclear. Pela primeira vez na vida, a pequena Ana Cristina conseguiu ouvir sons. A cirurgia ocorreu no Hospital das Clínicas, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em São Paulo
Com surdez severa [quando nenhum som de fala é audível em tom de conversação normal], mãe e filha foram internadas no hospital no dia 7 de setembro e três dias depois operadas. A cirurgia de Ana Cristina durou 3h, enquanto a de Erlene demorou 4h para ser finalizada.   Erlene perdeu a audição aos 7 anos de idade, mas com a ajuda de um Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI) conseguia ouvir e entender o que as pessoas diziam por meio de sinais e leitura labial. Para Erlene de Paiva, a cirurgia foi mais do que uma chance de ouvir os sons ao seu redor.
"Sofri muito preconceito na escola e nos lugares onde eu ia. As pessoas não compreendiam o que eu falava e nem sabiam se comunicar comigo. Às vezes quando chegava da escola, me trancava dentro quarto e não queria falar com ninguém, porque quando falava as pessoas me corrigiam, pediam para falar certo. Eu falo assim, não tem como eu mudar", conta Erlene ainda com dificuldade em se expressar.
Mãe e filha foram operadas no mesmo dia, em Campinas (Foto: Aline Nascimento/G1)
A mãe acredita que a cirurgia representa a possibilidade de uma vida normal para filha, longe das dificuldades enfrentadas por ela. "Não quero que ela passe pelo que eu passei, quero que ela tenha uma vida normal como qualquer outra criança", explica.
A vida de Erlene também tem mudado bastante desde que fez a cirurgia. A comunicação e a convivência com as pessoas ao seu redor melhorou. "Parece que a vida foi melhorando, passei a me comunicar mais com as pessoas, porque antes só falava com meu marido. Comecei a sair mais", conta.
Pai de Ana Cristina e marido de Erlene, Marivaldo de Paula lembra as dificuldades para conseguir a cirurgia e diz que faria tudo de novo. “As dificuldades fizeram todo diferencial, se não fosse difícil talvez não tivesse sido tão emocionante. Na hora eu revivi todas as dificuldades que passamos”, diz
Sobre o que sentiu ao ver sua filha ouvindo pela primeira vez, o pai não contém a emoção. “Quando tiraram ela [Ana Cristina] dos meus braços eu chorei muito, senti muito medo, senti um desespero. Primeiro foi a Ana para sala de cirurgia, quando acabou levaram minha esposa e eu fiquei aflito do lado de fora. Depois da recuperação, a Ana fez um teste com a fonoaudióloga e quando ela ouviu foi uma reação muito linda pareceu que ela tinha recebido uma dose de ânimo. Foi muito lindo”, conta emocionado
A cirurgia para o IMPLANTE coclear veio depois de seis meses de espera. Sempre confiante, Marivaldo de Paula, fez uma campanha no Facebook para chamar a atenção do Estado para a deficiência da filha. A cirurgia foi feita pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e parte das passagens, dele e da filha, foram cedidas pelo Tratamento Fora de Domicílio (TFD). Já as passagens de Erlene, foram compradas com o dinheiro arrecadado de uma rifa.
“As passagens minha e da Ana foram pelo TFD e da minha esposa eu paguei com o dinheiro da rifa. Estava pleiteando só duas passagens pelo fato dela [Erlene] não ser paciente ainda. Nós fizemos a rifa e conseguimos arrecadar R$ 2 mil e, assim, toda família conseguiu VIAJAR”, conta.
Através dos compartilhamentos das fotos de Cristina, no Facebook, várias pessoas de outros estados entraram em contato com a família para oferecer ajuda. De acordo com Marivaldo, uma família de Campinas entrou em contato com ele, pela rede social, para oferecer HOSPEDAGEM na cidade. Ele passou ter contato com pessoas que já tinha feito a cirurgia em diversas regiões do país.
“A campanha foi muito importante para que desencadeasse todos os fatos. Um rapaz de Campinas, que é implantado há mais de 15 anos, me ligou passando mais informações sobre a cirurgia, passou também o site do hospital onde a Ana faria a operação e me adicionou em um grupo de implantados no WhatsApp. Uma família de lá ofereceu um quarto na casa deles pra gente SE HOSPEDAR. Eles disseram que viram a história da Cristina e queriam ajudar enquanto estivéssemos na cidade”, recorda.
Marivaldo conta que durante a primeira viagem para realizar os exames em Ana Cristina, a esposa decidiu que faria a cirurgia para implantar o dispositivo eletrônico. A família retornou em maio ao hospital de Campinas, onde as duas pacientes fizeram uma avaliação para a cirurgia e receberam dois Aparelhos de Amplificação Sonora Individual (AASI).
A primeira viagem foi em março, para fazer uma avaliação na Ana. Perguntei se a Erlene queria fazer o implante. Ela topou. Fui ao site do SUS e fiz o cadastro dela. Voltamos em maio e elas receberam dois APARELHOS AUDITIVOS desses comuns e já começaram a fazer os exames para a cirurgia. A partir de maio, a Erlene já entrou como paciente”, explicou Marivaldo.Durante o terceiro retorno, no mês de julho, ao hospital para fazer mais exames, Ana Cristina e a mãe foram informadas de que a cirurgia seria feita somente em outubro, mas se surgisse alguma vaga, o hospital entraria em contato com a família. Depois que voltou para casa, em agosto, Marivaldo foi surpreendido com um e-mail do hospital avisando que a cirurgia teria sido adiada para setembro.
Parte do aparelho é implantado na parte externa da orelha (Foto: Aline Nascimento/G1)
No momento em que foi agendar a viagem no TFD, as pacientes receberam a triste notícia de que o órgão não poderia mais ceder as passagens, porque o prazo para VIAJAR estava muito próximo. A partir desse momento, Ana Cristina e Erlene passaram a depender de doações de amigos para viaja
“Quando vi o email fui logo marcar as passagens, mas o TFD negou, dizendo que não tinha como conseguir as passagens em um tempo tão curto. Eu tinha desistido, estava triste, pensei que não era pra gente viajar. Aí o pessoal do grupo no WhatsApp dos implantados, não me deixaram desistir. Gente de todo Brasil, uma moça do Rio Grande do Sul que começou a campanha no Facebook. Eles fizeram uma ‘vaquinha’ pra comprar as passagens”, relembra.
fonte g1