Com renda do lixo, catadora compra casa e carro no Acre

Sebastiana Soares Rodrigues, de 61 anos  (Foto: Janine Brasil/G1)
"Não importa o tipo de trabalho, o negócio é trabalhar para comer e conseguir comprar o que a gente quer". É com essa frase que a catadora de lixo Sebastiana Soares Rodrigues, de 61 anos, mãe de três filhos, moradora do bairro Conquista, em Rio Branco, explica como conseguiu conquistar o sonho de ter a casa própria e ainda comprar um carro.
Segundo a catadora, que mora com uma neta e uma bisneta, suas conquistas vêm do suor de uma rotina de trabalho árdua de sol a sol. "Eu trabalho como catadora de lixo reciclável há 15 anos. São mais de oito horas por dia de baixo de sol e chuva empurrando meu carrinho que não é leve", fala sempre sorridente.
Sebastiana conta que mora na Conquista há mais de 15 anos e que quando chegou ao bairro era um local com pouca estrutura, sem pavimentação. "Isso aqui hoje está uma beleza. Quando eu cheguei não tinha nada, a rua era toda cheia de lama. Ergui essa 'casinha' com muito esforço e trabalho, hoje tudo o que tem aqui é meu e dos meus filhos", diz orgulhosa.
A rotina de trabalho de dona Sebastiana começa bem cedo. Às 6h ela acorda, toma café da manhã, pega seu carrinho e sai pelos bairros catando dentro do lixo todo tipo de material que possa ser reciclado ou revendido.
"Eu ando por uns 15 bairros, junto garrafas pets, ferro, papelão, latinhas. Quando chego em casa para almoçar, descanso, vou para o quintal e começo a separar por tipo de produto. Cada um fica em um saco separado. Depois quando o sol baixa eu pego o carrinho de novo, lá pelas 18h, e fico até bem tarde", explica. 
Sebastiana não se incomoda em dizer qual é sua renda mensal, na verdade, ela sabe bem de onde vem cada centavo. "Só com o lixo reciclado, eu lucro por mês em torno de R$ 300 a R$ 500, mas isso depende da quantidade que eu junto. No melhor mês, eu consegui R$ 600 e no pior R$ 250".
Para conseguir faturar essa quantia, a catadora conta que trabalha todos os dias da semana. "Todo dia é dia para trabalhar, não tem essa de fim de semana. Eu junto uns dez sacos de 100 litros de material e tem um homem que passa aqui em casa no final do mês e compra de mim. Não sei para onde ele leva, sei que ele trabalha com reciclagem", fala.
Dona Sebastiana separa os produtos que pega no lixo em sacos para vender (Foto: Nathacha Albuquerque/GE)
Ela diz que o valor por quilo depende do produto. O quilo da latinha custa R$ 0,30, do plástico R$ 0,40 e do ferro R$ 1. "Não tem como dizer um valor exato que eu ganho, porque depende do mês, do tipo de material que eu junto. Só sei dizer que todo mês dá dinheiro e é com isso que eu pago a parcela do carro. Mas juntando tudo o dinheiro do comércio e da reciclagem, dá uns R$ 1 mil por mês", fala.
Além da casa própria, a catadora diz orgulhosa que tem um carro, ano 2007/2008, que comprou em novembro de 2010 com última parcela a ser paga em janeiro de 2015. "A história do carro é o seguinte, eu fiz o consórcio de uma moto com o valor da parcela de R$ 160 e financiei em 60 meses. Só que nunca fui sorteada. Quando eu terminei de pagar, peguei uma carta de crédito de R$ 8 mil. Aí minha filha, a Jane, teve a ideia da gente tentar comprar um carro. Fomos na revendedora e ela gostou de um Palio que era R$ 23 mil. Demos os R$ 8 mil de entrada, comprovamos renda no meu nome como autônoma e parcelamos o resto em 60 meses", diz.
Segundo Sebastiana, a vida dela não é tão fácil como parece. "Todo mês esse dinheiro do carro é sagrado. As vezes é apertado e eu atraso, mas Deus nunca me desamparou, por isso eu consigo pagar sempre. Comprei o carro para as minhas filhas. Eu não sei dirigir, mas elas me levam para os cantos quando eu preciso".
Sebastiana cata lixo e quando chega em casa trabalha em um comércio vendendo variedades e alimentos (Foto: Nathacha Albuquerque/GE)
Tino empreendedor
Além do carro e da casa, dona Sebastiana tem um comércio que construiu com suas próprias mãos. "Esse comércio que tem aqui na frente da casa eu construí pegando pedaços de madeira velhos que encontrava na rua. Fui pegando montando de pouquinho em pouquinho e hoje, além de sustentar minha família catando lixo reciclável, eu também vivo daqui".
Ela diz que a ideia de montar um comércio começou quando recebeu da namorada do filho roupas usadas. "Quando ela me deu, eu vi que poderia consertar algumas e tentar revender, deu certo, vendi e consegui um dinheiro. Aí minha filha foi na Bolívia e comprou umas roupas, aí eu vendi de novo", acrescenta.
A catadora conta que vende de tudo no comércio, roupa, bolsa, sapato, comida, refrigerante, cachorro quente. "Não tem hora para fechar, o povo aqui sabe que fica aberto direto, só que quando é tarde da noite eu vendo as coisas por uma janelinha, porque tenho medo de assalto".
Sebastiana Soares com as filhas Janaína Soares e Jane Soares (Foto: Nathacha Albuquerque/GE)

Sonho da filha

Jane Soares Rodrigues, uma das filhas de Sebastiana, diz que tem um sonho. "A gente quer escrever ela em algum programa de televisão que arruma o comércio das pessoas. Ela merece e faz tudo por nós. Trabalha tanto que às vezes a gente tem quer ir pra rua pra poder encontrar ela", fala.
A filha conta que as vezes fica preocupada com a saúde da mãe. "Ela sempre diz que está bem, mas a gente se preocupa. Ela quando acorda doente toma remédio e não tem ninguém que faça ela ficar em casa. Saí mesmo assim pra trabalhar", diz.
A catadora Sebastiana deixa uma lição de vida. "Eu tenho as coisas, porque eu sonho, porque eu acredito em Deus. Enquanto eu aguentar trabalhar, eu vou comprar minhas coisas", finaliza.
fonte   /g1.globo.com