Menina cega escreve carta em braile e pede notebook adaptado de Natal

Em meio às mais de duas mil cartinhas recebidas pelo projeto Papai Noel dos Correios, em Rio Branco, uma em especial chamou a atenção. Escrita em braile, a carta pede um notebook adaptado.
A autora da cartinha é Sarah Kamilly Santiago, de 12 anos, que é cega desde 1 ano e 8 meses. A garota diz que seu sonho é que ela e a irmã gêmea, Sarah Katrinny, também deficiente visual, possam se "conectar com o mundo" e ter uma vida de crianças "normais navegando pela internet".
"Escrevi a cartinha e minha professora traduziu. A gente quer esse notebook para estudar e brincar. Gosto mais de computador do que a Katrinny, mas se ganhar vou dividir com ela, é o nosso sonho ganhar um", diz Kamilly.
Ela e a irmã moram na casa da avó, a costureira Maria Santiago, de 60 anos, que não tem condições de comprar o equipamento. Maria diz que o computador vai ajudar bastante na educação das netas. "Elas precisam muito desse notebook. Não vou saber mexer para ajudá-las, mas elas são inteligentes e vão se virar bem", acredita.
Katrinny é quem ajuda a irmã gêmea Kamilly na escola (Foto: Janine Brasil/G1)
A avó conta que as gêmeas nasceram prematuras, de seis meses, e com retinopatia da prematuridade [quando há o crescimento desorganizado dos vasos sanguíneos, que suprem a retina do bebê].
"Os sintomas começaram quando elas tinham seis meses, percebemos que elas tinham uma pinta nos olhos. Os médicos aqui de Rio Branco disseram que era glaucoma, depois viajei com elas pelo TFD para Goiânia e São Paulo e falaram da retinoplastia. Foi um choque quando descobrimos, mas hoje somos todos felizes", garante.
Maria diz que mesmo com o diagnóstico precoce da doença, Kamilly perdeu a visão dos dois olhos com um ano e oito meses. Já Katrinny, enxerga apenas pelo olho direito.
"Foi tudo muito rápido. A kamilly ficou totalmente cega e a Katrinny ficou enxergando bem pouco. Ela vê só quando tem luz, não sei quantos por cento ela vê. Ainda bem que deu tempo de parar a doença em pelo menos uma delas", explica.
As gêmeas são muito unidades e fazem tudo juntas (Foto: Janine Brasil/G1)
Como Katrinny enxerga pelo olho direito é ela quem ajuda a irmã na escola. "A professora escreve no quadro, eu faço o meu, e depois dito tudo para a Kamilly e ela escreve na máquina de braile. Levo ela para beber água, ajudo na hora do lanche e pego papel pra ela. Ela é chata, mas gosto muito de cuidar dela", conta, sorrindo.
Kamilly diz que sem a ajuda da irmã seria difícil conseguir estudar em uma escola para crianças sem deficiência. "Às vezes choro quando ela fica com preguiça de me ditar as tarefas. Mas, se não fosse por ela, não sei como seria. Nós brigamos muito, mas é coisa de irmã, eu amo ela", conta.
Segundo Kamilly, sua rotina escolar é "puxada" (Foto: Janine Brasil/G1)
A avó diz que teve que abandonar a profissão de costureira para se dedicar à criação das netas. "Quem leva elas todos os dias para a escola sou eu. A mãe delas mora aqui, mas eu que cuido, assumi as duas. Faço tudo por elas, não me arrependo de ter parado de trabalhar  para ajudá-las", fala.
Maria explica que o estado é quem disponibiliza o material de estudo para Kamilly. "Os livros são pesados e muitos, porque é um livro para cada capítulo de livro. O governo fornece o livro em braile para a gente, depois que a professora passa os conteúdos. Depois ela recebe os livros para estudar em casa", explica.
A avó de Kamilly e Katrinny, Maria diz que largou a profissão de costureira para cuidar das netas (Foto: Janine Brasil/G1)
Kamilly diz que mesmo sendo cega, tem uma vida feliz e faz todas as atividades de uma criança normal. "Gosto de brincar de ser rica, de ser grande. Mas do que gosto mesmo é de jogar no computador e assistir televisão. A professora e eu temos um segredo, ela tem um programa que me ajuda a mexer no computador e brincar de cantar", conta.
A avó diz que a menina é feliz mesmo sendo deficiente visual. "Às vezes a gente até esquece que ela é totalmente cega de tão inteligente e esperta que a Kamilly é", elogia Maria. 
Ao menos 2 mil cartinhas foram encaminhadas para a campanha Papai Noel dos Correrios em Rio Branco (Foto: Janine Brasil/G1)
O coordenador da campanha Papai Noel dos Correios no Acre, Antônio Carlos Mourão, afirma que essa foi a cartinha mais inusitada que o órgão já recebeu em nove anos de campanha.
"Os pedidos geralmente nos deixam comovidos, mas esse, em especial, nos deixou mais. Vamos fazer de tudo para tentar atender o pedido da Kamilly e todos os outros também", afirma o coordenador.
Mourão conta que o órgão recebeu ao menos de duas mil cartinhas esse ano juntando as da comunidade com as das escolas. "Estamos correndo contra o tempo, temos até o dia 18 para conseguir que todos os sonhos das crianças sejam atendidos. Quem quiser ajudar ainda pode vir até os Correios do Centro e pegar uma cartinha", finaliza.
fonte   Do G1 AC